Responsável por atingir o marco de maior artista em integração da arte na arquitetura no território nacional, de forma que nenhum outro artista atingiu o tamanho de sua Obra Institucional, Athos Bulcão uniu a tradição da azulejaria à inventividade da composição aplicada na Arquitetura.
A tradição ceramista, que nasce de nossas raízes remontando as origens portuguesas através dos painéis figurativos compostos por pequenos módulos cerâmicos pintados, ganhou destaque a partir do período moderno através de nova vertente trazida pela produção dos azulejos abstratos geométricos.
Iniciou sua carreira como assistente de Cândido Portinari no desenvolvimento do painel São Francisco de Assis, na igreja da Pampulha em Minas Gerais, o que possibilitou seu entendimento filosófico e artístico na relação entre Arte e Arquitetura.
A obra de Athos Bulcão, diferentemente de outros campos da Arte, é fortemente vinculada ao caráter urbano, por meio da aplicação dos painéis e azulejaria em elementos arquitetônicos públicos (empenas, muros, entre outros), pautada pela aproximação entre o pedestre e a obra.
Embora assuma extensão, o excepcional trabalho de Athos no desenvolvimento da arte em azulejaria é marcado por um dos principais objetivos na arte abstrata geométrica: a aplicabilidade da obra, de forma que o mesmo não seja confinado em áreas expositivas, como galerias, museus ou instituições, mas que seja compartilhado à cidade.
A experiência da aplicabilidade de seu trabalho na capital brasileira, assim como a própria construção de Brasília, remonta a experiência como um vasto campo de experimentações, passível de idealizar ensaios e variantes do grafismo final de cada um dos trabalhos.
Os painéis presentes nas obras arquitetônicas de Oscar Niemeyer e Lúcio Costa ilustram de um jeito peculiar, como o processo construtivo da arquitetura moderna brasileira buscava a aproximação entre diferentes campos artísticos e transição entre escalas.
Da malha urbana ao lote, do espaço edificado ao espaço livre, do desenho do edifício ao desenho do objeto, e justamente nesse último é que o trabalho de Athos emerge, criando identidade aos edifícios.
Em Brasília, todo o processo permitiu que o artista testasse os padrões das peças, por meio de simples mecanismos, como rotação e variação. Portanto, concebeu cada um dos padrões gráficos de suas peças a partir de linhas e cores puras, numa escala variante entre formas geométricas primárias em conjunto a uma série de linhas e também à mudança entre cores primarias e secundárias.
A originalidade do conjunto de sua obra tem notoriedade de forma que o simples gesto de rotação de modo individual de cada uma das peças resultava em um novo padrão. Assim, nota-se que entre as propriedades marcantes, uma das características é sua despretensão, de modo que o artista criou uma situação confortável para que, eventualmente, os operários pudessem organizar cada um dos murais de forma bastante livre e abstrata, respeitando apenas um conjunto de poucas regras compositivas estabelecidas, como o encaixe de linhas e rotações. Nenhum painel, independente da dimensão ou padrão do azulejo, conseguiria ser igual ao outro, visto que a interpretação nasce ao olhar do operário de modo conjunto, como se o trabalhador assumisse coautoria no processo de montagem da obra.
A partir disso, analisando sua obra de maneira crítica, compreendemos que para ele existem pelo menos quatro tipos de padrão das peças dentro de um mural. Em outras palavras, dentro de um mesmo painel pode existir até quatro tipos de azulejos, agindo sob um padrão gráfico variante a partir de um conjunto de linhas e cores similares e estes podem ser aplicados de inúmeros modos dentro do arranjo.
Entre as principais obras destacam-se: Painel de azulejos ao Centro Cultural Missionário da CNBB (1995); Painel para o Brasília Palace Hotel (1958); Fachada em ladrilho hidráulico do Edifício Niemeyer (1960); Painel de azulejos ao Batistério da Catedral Metropolitana de Brasília, (1970); Painel de azulejos do Aeroporto Internacional Juscelino Kubitschek (1993); Painel para o Centro de Formação e Aperfeiçoamento da Câmara dos Deputados - CEFOR, (2003); entre outros exemplos.
Atualmente, fazendo uma compilação entre a arte resgatada das tradições portuguesas nas obras modernistas pela ressignificação cultural, aproximando a Arte à Arquitetura de modo reinventado e o papel da azulejaria dentro das obras arquitetônicas contemporâneas no território nacional, há dois artistas plásticos, sobretudo azulejistas que tem se destacado por transformar a pequena peça cerâmica em grandes murais, ousando no uso, padrão e composição: a carioca Adriana Varejão e o mineiro Alexandre Mancini.
Alguns dos escritórios brasileiros em ascendência têm se apropriado dos elementos para compor a fachada de edifícios, aproximando Arte e Arquitetura como “doação” dos painéis à área pública ou mesmo, incorporando-os à projetos privados, mas em sintonia com o trabalho arquitetônico.
Entre as obras que se destacam com a aplicação da azulejaria da artista Adriana Varejão, podemos citar o Edifício Leblon (2017), concebido pelo arquiteto Felipe Hess, aplicando as peças em jardineiras voltadas para a rua, de maneira pontual. Ou mesmo a Galeria Adriana Varejão (2008), projetada pelo escritório Tacoa Arquitetos para receber obras da artista, de forma que azulejos são pontualmente dispostos nas paredes do pavimento térreo e nos bancos externos, destacados sob a luz natural.
No caso da azulejaria do artista Alexandre Mancini, podemos identificá-la em algumas residências pelo país, como é caso da Casa Maracanã (2009), projetada pelo escritório Terra e Tuma.
Ainda há escritórios focados na arte da azulejaria como parte compositiva do processo criativo ao desenho do edifício, ou seja, a menor escala condiciona o desenvolvimento da maior escala como é o caso do edifício POP XYZ (2016), concebido pelo escritório franco-brasileiro Triptyque Architecture, onde as peças e cores criam a identidade gráfica do edifício numa divertida composição, como um jogo de tetris.
Contanto, os azulejos de Athos Bulcão ainda são empregados em painéis e empenas, fundindo-se à Arquitetura, como por exemplo, sua aplicação na Casa Osler (2009), projetada pelo Studio MK27, através de um painel desenhado especialmente para o projeto e sendo possivelmente considerado uma das últimas obras do artista que infelizmente, por sua partida durante o processo construtivo da residência, não teve a oportunidade de vê-la concluída.
Ainda podemos citar a Casa 7x37 (2010), concebida pelo escritório CR2 Arquitetura, se apropriando do uso de azulejaria de Athos em homenagem à arquitetura moderna brasileira e buscando conectar as raízes da cliente em sua residência.
De fato, a obra de Athos é mais que técnica e expressividade, é um legado. Veja, abaixo, uma galeria com diversas obras:
Referências
FEITOSA, Aline Nunes. Athos Bulcão: Sua arte e turismo cultural em Brasília. 2005. 44p. Trabalho de Conclusão de Curso – Departamento de Turismo da Universidade de Brasília. Brasília, 2005.
Fundação Athos Bulcão. Athos Bulcão. Disponível em: <http://www.fundathos.org.br/athos-bulcao>.
Fundação Athos Bulcão. Galeria virtual. Disponível em: <http://www.fundathos.org.br/projetos>.